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Sobre esse blog

Não tenho nenhum laço familiar com Ruth Bessoudo. Ela foi, durante longos anos, amiga de meu sogro Pierre. Eles se conheceram no Rio de Janeiro, quando Pierre trabalhava na Aliança Francesa. No fim dos anos 1990, compartilhei algumas vezes o almoço de domingo com Ruth, em Paris, na casa de meus sogros. Ela ja era então bem idosa.

Sobre ela, apenas sabia que era artista plastica, gravadora, e que vivera na Venezuela e no Brasil, antes de morar na rue du Théâtre, no numero 57, perto da casa de Pierre.

Logo percebi que Ruth era uma pessoa reservada e que não falava por falar. Observava, escutava e raramente participava da conversa, mas sempre de forma oportuna e interessante/para acrescentar algo de util. Durante aquelas refeições, meus sogros se expressavam misturando português e francês, passando com frequência de uma lingua a outra. Como eu não tinha nenhum dominio do português, o esforço para compreender o que se dizia me impedia de captar as nuances da conversa e o humor por detras das palavras. Não fui capaz de fazer perguntas a Ruth sobre sua vida passada, o que hoje lamento.

À época, Pierre ja estava começando a ter os primeiros sintomas do mal de Alzheimer. Antes que a doença o impedisse de fazê-lo, ele visitava regularmente Ruth em uma clinica de idosos onde ela passara a viver. Eu propria, quando Pierre não conseguia mais ir até la sozinho, o levava de carro para ver Ruth e esperava para leva-lo para casa. Ele me contava então que ela sofria de demência senil e que às vezes até ficava agressiva.

Depois, Pierre foi, por sua vez, hospitalizado em um estabelecimento para pessoas idosas, teve de ser posto sob curatela e não pode mais visitar a amiga. Quando ela morreu, em 2015, foi aberto um testamento, feito em Nice, que fazia de Pierre o unico herdeiro do apartamento parisiense de Ruth e de tudo o que la havia. Meu marido, responsavel legal pelo pai, me deu a chave do apartamento para que eu o esvaziasse, ja que eu tinha mais tempo do que ele. Foi naquele quarto-sala-cozinha e atelier empoeirados, pois o apartamento estava desocupado ha longos anos, que descobri toda a vida de Ruth e, em parte, a vida de seu marido, Amy. Dia apos dia, triagem apos triagem fui descobrindo o interesse historico e artistico da existência de Ruth. Reuni os pedaços do quebra-cabeças, fiz perguntas para as poucas pessoas ainda vivas que a tinham conhecido e, agora, reconstituo sua historia, esperando fazê-lo o mais fielmente possivel.

Meu desejo é levar para o centro do palco, através da internet, « a sempre discreta e modesta Ruth Bess », excelente artista cujas gravuras admiro. Muitas de suas obras estão presentes nas coleções de museus da America do sul e America do norte .Como ela não fazia exposições desde 1990, pareceu-me que fora esquecida, o que ela não merece.

Assim, lanço-me a essa tarefa, para que ela se torne « Ruth Bess, a rainha dos tatus e dos tamanduas ».

Sylvie MERIGOUX

Avec mes remerciements à Jovita Maria Gerheim Noronha Collinot pour la traduction en portugais.